Karina Bidaseca
Tradução: Caroline Marim, Raísa Inocêncio. Revisão: Susana de Castro.
Rio de Janeiro: Editora NAU, 2022
Pássaro de Oceano nasceu inspirado no filme que a artista cubana Ana Mendieta, exilada nos EUA e atirada de uma torre em Manhattan, gravou em Oaxaca. Seu corpo, seus escritos performativos no mar, suas “Silhuetas” esculpidas em Cuba reúnem sete anos de pesquisa de Karina Bidaseca sobre a obra de Mendieta, a partir de um diálogo com sua curadora Petra Barreras del Río em Nova York, que começou em 2014.
Para a autora situar o livro no Brasil é um gesto estético amoroso que nos abre a outros mundos amefricanos ligados à espiritualidade cosmogónica para abraçar as ancestralidades dos povos Yorubá do continente; uma fonte da qual a artista bebeu para esculpir em pedra calcária as formas das antigas divindades e orixás femininos. Para compô-lo, afirma a autora: “Abracei as tradições espirituais dos Yorubás e elementos do catolicismo em África” (citado por del Río, 1988: 43), e a dos índios taínos, escreveu a artista, permitindo-nos recuperar os traços de africanidade na ideia de AméfricaAnaMendieta, palavra cunhada nos anos 70 pela afrofeminista brasileira Lélia Gonzáles (1935-1994), co-fundadora do movimento de mulheres negras Nzinga no Rio de Janeiro, com o nome da Rainha Jinga (Nzinga) que desempenhou um papel de grande importância na luta contra o opressor português em Angola.
Onde está Ana Mendieta? Esse continua a ser o grito coletivo, o ecos-mundo glissantiano face à justiça patriarcal que permanece, embora ameaçada. Procurado em museus e na sua dramática viagem entre o exílio e a sua morte em 1985, o grito marcou um divisor de águas na história da desigualdade de género, no campo da arte e das organizações feministas como a WAC (Women’s Action Coalition).
Esta pergunta colocada pelo movimento feminista pode ser pensada dentro da sua própria obra, como uma proposta de desmaterialização que transcende, por meio da configuração de silhuetas, traços, rastros, sua memória.